quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Cães


O minhoto Tomaz de Figueiredo, e os cães


"...Literariamente, nasci livre. Abraçado a esta liberdade, minha luz e minha cruz, irei até que feche os olhos, se tiver quem mos feche. E penso ainda, questão de querer ( o mais custoso, a quem pode querer ), tornar-me lá à minha casa do Minho - hoje casa de fantasmas -, aos meus horizontes de rio e de penedos, aos meus limoeiros e laranjeiras, ao meu retiro entre buxos, à minha fonte só minha, ao meu silêncio que assombram vozes antigas. Lá, arranjar um perdigueiro, mas de raça, afeito a pensar, nem que por ele dê uns contos. Pategos, nem cães! E seja-me ele companheiro, fale-lhe e entenda-me, queira-me o afago na cabeça, conte-lhe doutros da sua raça, que em tempos lá preguiçaram às mesmas sombras e me acompanharam pelas mesmas serras, alguns que por lá deixaram descendência. Netos, hoje, em que grau? E levá-lo ainda comigo às perdizes e galinholas, ser digna dele, ainda, a minha espingarda. Primeiramente, conversaremos os dois, entender-me os olhares, contar-lhe que também precisei de morder, porque amei, que também eu tive uma vida de cão."

Tomaz de Figueiredo, final do prefácio do livro de novelas Vida de Cão .